A Reforma Tributária brasileira, instituída pela Emenda Constitucional nº 132/2023, marca uma das maiores transformações no sistema fiscal do país em décadas. Com implementação gradual a partir de 2026 e transição até 2033, a mudança promete simplificar a estrutura tributária, fomentar a competitividade e melhorar o ambiente de negócios. No entanto, seu impacto vai muito além do campo legal: ele atravessa departamentos fiscais, contábeis, jurídicos e de tecnologia, exigindo um reposicionamento estratégico das empresas.
Entre as principais mudanças estruturais previstas, destaca-se o conceito de IVA Dual (Imposto sobre Valor Agregado), que substitui cinco tributos existentes por dois novos: a CBS, de competência federal, e o IBS, de competência estadual e municipal. Esse modelo, adotado por países como Canadá e Índia, visa garantir maior simplicidade, transparência e neutralidade na tributação do consumo, respeitando a autonomia dos entes federativos. A criação do Imposto Seletivo, voltado a produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, também integra essa reestruturação, reforçando o caráter regulatório da nova política fiscal.
Mais do que compreender a nova lógica de tributação, é necessário preparar-se para operá-la na prática, o que envolve mudanças significativas em sistemas, processos e estruturas organizacionais. Nesse cenário, os CIOs e CTOs assumem um papel estratégico, liderando a adequação dos sistemas corporativos, a integração de dados e a modernização da arquitetura tecnológica necessária para sustentar a transição tributária.
Neste artigo, reunimos uma análise multidisciplinar dos principais efeitos da Reforma, destacando os riscos, as oportunidades e os caminhos de adaptação para empresas que desejam se antecipar às exigências desse novo cenário.
Perspectiva Fiscal: um novo modelo de arrecadação
A proposta da Reforma substitui cinco tributos atuais: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS, por dois novos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), gerido por estados e municípios. Além disso, será criado um Imposto Seletivo, aplicado a bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
Um dos pilares da nova estrutura é a não cumulatividade plena, o que significa que as empresas poderão utilizar créditos em toda a cadeia produtiva. Embora o modelo prometa maior transparência e neutralidade, os impactos imediatos podem ser significativos, especialmente para setores com poucos créditos recuperáveis, como serviços e tecnologia.
Impacto da Reforma Tributária por setor:
Fonte: Dootax. Consulta de impacto por setor com base na PEC 45/2019. Disponível em: https://dootax.com.br/reforma-tributaria-impacto-setores-consulta/
Como consequência dessa nova lógica, estima-se que a alíquota combinada da CBS e do IBS gire em torno de 25%, segundo simulações feitas por consultorias como KPMG e Deloitte. Esse percentual, embora pensado para manter a arrecadação atual, pode representar um aumento de carga tributária para empresas hoje optantes pelo Lucro Presumido, que muitas vezes se beneficiam de regimes simplificados. Nesse sentido, o planejamento fiscal deverá ser revisto, com especial atenção à composição de preços, políticas de repasse e revisão contratual.
Impactos contábeis: reorganização da estrutura financeira
A nova estrutura de tributos impõe uma série de ajustes contábeis às empresas. Um dos principais pontos é o fim da lógica de insumo como critério para créditos tributários, substituída por um modelo em que todos os gastos relacionados à operação geram crédito automaticamente. Esse novo desenho afeta diretamente o registro de receitas, apuração de custos e provisões tributárias.
A contabilização dos novos tributos exigirá revisão nos planos de contas, nos centros de custo e na forma de mensurar a rentabilidade por produto, unidade ou cliente. A separação entre regimes durante a fase de transição, em que os tributos antigos e novos coexistirão, traz desafios adicionais, especialmente na consolidação de demonstrações financeiras.
Empresas que utilizam ERPs como SAP, TOTVS e Oracle precisarão adaptar seus sistemas para refletir essa nova lógica contábil. Isso inclui ajustes em tabelas fiscais, motores de cálculo, relatórios e integrações com BI e ferramentas de controle gerencial. O time contábil terá papel fundamental na tradução técnica da reforma para os demonstrativos financeiros e na preparação de auditorias.
Nesse contexto, a atuação conjunta entre contabilidade e TI torna-se ainda mais estratégica, especialmente diante da necessidade de parametrizações específicas nos motores de cálculo fiscal. A Meta, como parceira SAP, apoia essas adequações técnicas em sinergia com as mudanças operacionais exigidas pela nova legislação.

Desafios jurídicos: transição, disputas e governança contratual
O novo sistema de tributos, embora mais simples em sua proposta, traz muita incerteza jurídica, especialmente no período de transição entre 2026 e 2033. A coexistência de regimes pode gerar bitributação em alguns casos, exigindo uma atenção redobrada da área jurídica para evitar passivos inesperados.
Além disso, muitos contratos atuais têm cláusulas que não preveem mudanças estruturais como essa. Será necessário revisar índices de reajuste, cláusulas de repasse e prazos de vigência, à luz da nova tributação. A jurisprudência e as normas infralegais ainda serão consolidadas, o que aumenta a importância de uma atuação proativa do jurídico.
Também são esperadas disputas sobre creditamento, restituição e interpretação da base de cálculo da CBS e IBS. A atuação preventiva por meio de pareceres, memorandos internos e atualização contratual será essencial para mitigar riscos e garantir segurança jurídica em novos negócios.
Transformação tecnológica: a base invisível da adequação
A tecnologia ocupa uma posição estratégica na implementação da Reforma Tributária. O novo modelo exige rastreabilidade, consistência e padronização de dados, o que demanda sistemas robustos e bem integrados. Para muitas empresas, isso representa não apenas ajustes, mas verdadeiros projetos de transformação digital.
Os principais pontos de atenção incluem:
- Adequação dos ERPs (como SAP, TOTVS, Oracle, entre outros) para refletir as novas regras tributárias e contábeis.
- Atualização de motores de cálculo fiscal, parametrizações e planos de imposto.
- Revisão de obrigações acessórias, com impacto direto na forma de emissão de notas fiscais, geração de arquivos SPED e apuração de tributos.
- Automatização de relatórios e dashboards para acompanhar alíquotas, créditos e repasses.
Empresas que já investiram em digitalização e centralização de dados tendem a sair na frente. Aquelas que ainda operam com múltiplos sistemas, planilhas paralelas e processos manuais enfrentarão maior complexidade. Neste cenário, times de tecnologia e compliance tributário devem atuar em sinergia, com acompanhamento constante das atualizações legais e sistemas fornecidos por fornecedores de software fiscal e ERP (vendors), como SAP, TOTVS, Oracle, Thomson Reuters, entre outros.
A Meta já vem acompanhando esse processo de forma ativa. Em nosso artigo “Reforma Tributária: desafios e oportunidades para empresas que utilizam SAP”, publicado em janeiro de 2025, destacamos como empresas podem se antecipar às mudanças por meio de uma abordagem estruturada, que integra tecnologia, compliance e estratégia fiscal. O conteúdo é especialmente útil para organizações que utilizam SAP e outras plataformas de gestão empresarial.
CNPJ alfanumérico e obrigações acessórias: modernização e complexidade
Entre as mudanças estruturais que acompanham a Reforma Tributária, destaca-se a introdução de um novo modelo de CNPJ alfanumérico, que trará mais granularidade ao registro de informações fiscais. A proposta é criar uma estrutura semelhante à do código IBGE, permitindo o detalhamento por estabelecimento, atividade e localização, com maior controle por parte do Fisco.
Do ponto de vista técnico, essa alteração impacta diretamente:
- Bases de dados internas e de fornecedores;
- Sistemas de ERP, CRM e cadastro de clientes;
- Integrações com plataformas bancárias e fiscais;
- Documentação de compliance e obrigações acessórias.
As empresas precisarão revisar seus cadastros e ajustar seus sistemas para aceitar esse novo formato, além de garantir que todos os registros estejam atualizados, validados e sincronizados. As obrigações acessórias, por sua vez, também serão reformuladas para refletir o novo modelo de arrecadação, o que pode significar aumento na frequência de entregas, exigência de granularidade de dados e integração em tempo real com o Fisco.
Esse cenário demanda uma abordagem mais robusta de governança de dados, com integração entre sistemas e gestão precisa dos cadastros fiscais. A Meta apoia empresas na modernização de suas estruturas tecnológicas para lidar com essas exigências por meio de soluções focadas em arquitetura de TI, serviços de DataOps e automação inteligente, incluindo a implementação de Agentes de Inteligência Artificial (AI Agents), para suportar a jornada operacional em tarefas rotineiras.
Antecipação estratégica para liderar a transformação
Mais do que uma reforma tributária, o Brasil vive uma transformação sistêmica. O novo modelo de arrecadação não impacta apenas os impostos, ele altera a lógica de operação das empresas, exigindo uma integração inédita entre áreas como TI, fiscal, contabilidade, jurídico e planejamento.
As empresas que se limitarem a reagir à medida que as obrigações entrarem em vigor tendem a enfrentar sobrecarga operacional, riscos jurídicos e perda de competitividade. Em contrapartida, aquelas que tratarem a Reforma como uma alavanca estratégica, com investimentos estruturados em tecnologia, governança de dados e revisão de processos, estarão mais preparadas para crescer de forma sustentável.
Recomendações práticas:
- Crie um comitê multidisciplinar para acompanhar a transição e revisar políticas internas.
- Revise seus sistemas de ERP e motores fiscais com fornecedores homologados.
- Reavalie contratos comerciais com cláusulas de repasse e reajuste.
- Invista na capacitação de times contábeis, jurídicos e de TI, com foco no novo modelo.
- Monitore continuamente a legislação complementar e os ajustes infralegais que seguirão sendo publicados até 2033.
- Revise seus processos internos para identificar oportunidades de automação e uso estratégico da inteligência artificial, aumentando a eficiência operacional e fortalecendo a gestão financeira da empresa.
A Meta apoia as empresas nesse processo com soluções tecnológicas robustas, times capacitados e uma abordagem multidisciplinar que integra TI, dados e negócios. Atuamos como parceiros estratégicos na modernização de sistemas e na preparação das organizações para os desafios operacionais da nova lógica tributária.